terça-feira, 29 de outubro de 2013

RELACIONAMENTOS ELÁSTICOS









 publicado na Revista Bem-Estar, Diário da Região, 27/10/2013




Encontrei-a ali, braços envolvendo as pernas dobradas, cabeça enterrada no colo feito bicho assustado. Ao olhar para mim, seus olhos vermelhos de tanto chorar continuaram a despejar lágrimas que desciam grossas enquanto, entre soluços, sua boca balbuciava algumas palavras após a minha pergunta: - O que houve? Conte-me!
Parecia uma adolescente me relatando o rompimento com o namorado. Porém, ela não era adolescente e o que me intrigou: não se tratava de um rompimento.
Aquela relva verde e macia era um convite para uma caminhada. Estendi a ela minha mão para tirá-la daquela posição quase fetal e apontei a estrada com um gesto imperativo e protetor: “vamos por aqui!”. Para minha alegria, ela segurou em minha mão e num impulso, se levantou. E enquanto caminhávamos e sorvíamos o sol pintar o céu de tons rubros até se esconder, fiquei ouvindo sua narrativa. Enquanto ela se desabafava comigo, lembrei-me do terapeuta americano John Gray e pensei: “minha querida, você está dentro de um relacionamento elástico”.

Um elástico se estica até certa distância e então volta. Assim são alguns homens na sua forma de amar. Precisam de distância seguida de aproximação. Isso se repete como um ciclo. Eles se afastam, voltam, se afastam, voltam. Não há rompimento. E pasmem, na fase do afastamento, não há traição. É como se eles estivessem “de dieta” do relacionamento.
E por que isso acontece? Eles não querem compromisso? Temem a intimidade? Temem perder a autonomia e independência e ao mesmo tempo querem amar?
 Homens elásticos se afastam quando se sentem envolvidos demais. Ao contrário do que as mulheres geralmente pensam: - Ele não gosta mais de mim! – ele está tão apaixonado que precisa de um tempo para administrar seus sentimentos, inseguranças, ciúmes, enfim, precisa de um tempo para reorganizar-se.
Quando os homens elásticos se reaproximam, tendem a agir normalmente, sem explicações, sem justificativas, como se nada houvesse acontecido. Afastam-se por três, quatro semanas e ligam dizendo “olá!” como se tivessem aparecido no dia anterior. E há aqueles que dizem: - Sumida! Aí, a pessoa não sabe se está ficando louca ou se já ficou. – Eu? Sumida? Tem certeza?
Não adianta ficar maquinando o que foi que fez de errado, o que falou que ele não gostou, qual foi a situação que causou o afastamento. Nananinanão! O homem elástico se afastará mesmo que a mulher nada tenha feito e isso não tem relação com falta de amor. É algo que emerge sem planejar.
Homens elásticos podem enriquecer o relacionamento, quando compreendidos. No período de afastamento, basta as mulheres se distraírem com algo, fazerem suas coisas, se divertirem e deixa-los em paz.
Mulheres do tipo absolutamente seguras entendem que não adianta querer forçar a barra neste momento do ciclo. Não é hora de conversar, de cobrar, de discutir a relação. Quando eles se reaproximarem, elas podem necessitar de um tempo para a reconexão e podem expressar o desapontamento e todos os sentimentos que este afastamento nelas provocou. Sem dramas.
A boa notícia é: pode ocorrer de, numa destas fases de afastamento dos homens elásticos, as mulheres se depararem com algum homem plenamente não elástico. Porque para alegria de todas e felicidade geral da nação, eles existem, claro!
E então, os homens elásticos, ao voltarem para aquele lugarzinho aparentemente cativo no coração das mulheres, o encontrarão o-cu-pa-do. C’est la vie!

Kátia Ricardi de Abreu
Psicóloga Clínica e Organizacional especialista em Análise Transacional, Diretora da Ego Clínica e Consultoria. www.katiaricardi.com.br