sexta-feira, 30 de outubro de 2015

NOVO AMOR

Hoje pela manhã, um pássaro voou, pousando tão próximo que eu pude derrubar meus olhos sobre ele com tempo suficiente para ver suas cores, seu bico, o desenho perfeito de suas asas. E mal meus olhos haviam chegado até as asas, já não o encontraram mais. Criatura de Deus, ágil e faceira, voou para bem longe sem que eu pudesse guardar mais lembranças dos segundos de tempo em que passou pela minha vida.

 Posso ver outro igual, parecido, mas este, certamente não mais cruzará o meu caminho. Ou talvez, ele volte por aqui, mas eu não o reconhecerei.

Outras criaturas de Deus ficam por mais tempo na minha morada. Como a coruja, que todas as noites me espera no mesmo lugar e baila sobre a capota do carro durante uns cem metros  - provavelmente a distância suficiente para proteger seu ninho. Ou ainda, como o urutau que se confunde com o tronco da árvore há vários dias e o casal de tucanos na árvore farinheira.

Determinada a aprender com a natureza, passei a me acostumar com o canto das cigarras e o coachar dos sapos. Surpreendida com visitantes inofensivos da mata quase urbana, como as lagartixas, lagartos, teiús, gambás, saguis e por aí afora. Até mesmo um coelho todo saltitante já apareceu na relva, todo branco e orelhudo.

Com o tempo, fiquei mais envolvida com os tons de verde da natureza e desenvolvi habilidades de jardinagem para cuidar das plantas e respeitar os bichinhos da cadeia alimentar. Abelhas? Deixe-as aí na bananeira. Aranhas? Deixe-as aí com suas teias entre os galhos das árvores.  Quando algum bicho me incomoda, lembro-me de São Francisco de Assis. Saúdo sua presença e faço dele mais um companheiro da minha morada.

Aprendi que ninguém passa pela nossa vida por engano. Não existem erros nos planos de Deus. Nem  uma formiguinha cruza nosso caminho por acaso. Mesmo que a ela não tenhamos dado alguma importância. Aprendi também, que pessoas e criaturas ficam nas nossas vidas o tempo necessário aos planos de Deus. Como o pássaro que cruzou comigo hoje pela manhã. Aprendi que nossa felicidade, não pode depender da permanência de pessoas e criaturas em nossas vidas, por mais que seja grande nosso amor por elas. Amar é desapegar-se. Permitir que novas pessoas e criaturas entrem e sejam carinhosamente acolhidas, abrindo outros ciclos de relacionamento nos faz aprendizes e nos fortalece.

Meu pastor alemão, eutanasiado recentemente, deixou um enorme vazio na minha vida. Mas em todos os momentos nos quais sua ausência foi sentida, agradeci pelo tempo em que estivemos juntos, em que nossas vidas se cruzaram. Como diz Joanna de Ângelis, "nos níveis nobres da consciência de si e da cósmica, a gratidão aureola-se de júbilos, e os sentimentos não mais permanecem adstritos ao eu, ao meu, ampliando-se ao nós, a mim e você, a todos juntos. A gratidão é a assinatura de Deus colocada na Sua obra. Quando se enraíza no sentimento humano logra proporcionar harmonia interna, liberação de conflitos, saúde emocional, por luzir como estrela na imensidão sideral".

Sem qualquer pretensão de substituir este companheiro fiel, o Universo me enviou seu provável sobrinho. Recebo-o com amor. Afinal, "talvez a verdadeira felicidade seja essa: se esquecer de qualquer outra coisa que não esteja diante dos teus olhos enquanto você sorri".






quinta-feira, 15 de outubro de 2015

FIDELIDADE



Não tivemos despedida. Eu não sabia que ele iria embora da minha vida assim, de repente. Se eu soubesse, teria amado mais. Teria aproveitado mais os poucos minutos que estivemos juntos, contados e roubados dos meus afazeres, compromissos, deveres, responsabilidades.

Tratei-o com muito dengo. Permissiva demais, fui fazendo vistas grossas e deixando-o usar e abusar, transgredir regras. Tive que mudar alguns conceitos para aceitá-lo na minha vida. Que eu me lembre, só nos desentendemos uma vez. Fui corajosa, firme com ele e nunca mais ele ultrapassou os limites comigo.

Seu tamanho exageradamente grande às vezes me assustava, quando desprevenida. Mas eu me derretia como manteiga com o olhar terno, carinhoso, que ele me dirigia.
Parecia que ele sempre queria me ver. Ou, talvez, todo esse amor nunca existiu e foi apenas uma fantasia construída pela minha cabeça para suprir minha necessidade de me sentir amada. Não importava se estava calor, chovendo ou fazendo frio, parecia que ele sempre queria me ver.

Sonhei com ele antes de sermos apresentados. Sabia que seria uma experiência gratificante, assim que meus olhos se encontraram com os dele. Não sei se eu o escolhi ou se ele me escolheu. Sei que tivemos um relacionamento intenso, profundo, embora passageiro demais para o meu gosto.

Como se estivéssemos em um Universo paralelo, falávamos no silêncio a linguagem que só as almas entendem.

Uma grande perda. Vai ser difícil me acostumar com a ausência deste amigo fiel. A ele, minha homenagem! Vai em paz, seja o guardião do céu!.